imagem retirada da net
Carta que encerra a história dos amores de Mariana e Bernardo. Depois disto pouco se sabe, mas crê-se que Mariana morreu pouco depois com uma pneumonia e que Bernardo ainda vive num lar de luxo para idosos onde suspira pelo amor perdido. Doou toda a sua fortuna à fundação Mariana Gouveia.
“ V., 16 de Outubro de 1975
Meu querido Bernardo,
Faz agora pela altura da queda da folha vinte anos que te vi pela última vez. Sei muito bem, porque no dia em que nos despedimos naquele parque ao pé de tua casa, a brisa do fim de dia fazia dançar as folhas que caíam devagar até ao chão atapetando-as de mil cores. Deves estar velhote meu querido, não estás? Já tens cabelos brancos? Os meus estão brancos como a neve que cobre a serra no Inverno. O tempo passou e já apagou a mágoa. Mas de vez em quando, muito de vez em quando, especialmente na estação dourada lembro-me de tudo e revivo como se recuasse no tempo. Vejo-te chegar alegre, gracioso, bonito como um artista de cinema. Chegaste e sorriste para mim como se apenas eu ali estivesse. E o meu dia iluminou-se! Nesse dia ainda não sabia o quanto sofreria por tua causa...
Estive tão apaixonada por ti. Eras a minha luz, o sol do meu céu. Cada palavra tua, cada poema que declamaste para mim fizeram de mim uma mulher feliz. Cada gesto de carinho, cada beijo, me fez feliz. Eu fui muito feliz. Ate aquele maldito dia em que vi pela primeira vez os dois lados de ti. Ouvi-te dizer à tua mãe que abdicavas de mim a troco da fortuna. O meu mundo ruiu. Fiquei sem sangue. Fiquei gelada de morte. Não podia ser verdade e no entanto ouvi-te claramente dizer que não me voltarias a ver. A tua mãe viu-me e sorriu, vitoriosa, e tu calaste para sempre o meu nome sem saber que te tinha ouvido. E tudo no dia em que me fizeste juras de amor debaixo do velho plátano já quase nu. Lembraste desse dia? Vestias uma velha camisola castanha e usavas um velho cachecol de lã e parecias mesmo um menino rebelde! Quando eu cheguei já estavas a minha espera e estreitaste-me nos braços e beijaste-me nos lábios. Nos teus olhos trazias a alegria de um amor perfeito e nas mãos trazias uma rosa vermelha… foi mágico esse momento em que te ouvi dizer pela primeira vez “amo-te”…
Parti. Nunca te tinha dito o porquê mas digo-to agora. Parti nesse dia para nunca mais te ver, nunca mais te falar, fiquei com raiva, fiquei com muita raiva de ti por teres sido capaz de me trocar pelo dinheiro da tua mãe. Todas as cartas que me escreveste depois estão ali guardadas. Atei-as com uma fitinha azul céu igualzinha aos teus olhos. As vezes leio essas cartas e penso se estarias arrependido de verdade. Hoje sei que sim, mas todas as minhas recusas em perdoar-te, em sequer responder-te não me deixaram ver na altura certa o teu arrependimento. Sei que tens bom coração e a tua ganância de momento foi combatida, foi destruída. Mas o que tínhamos jamais voltaria. Sei que ficaste sempre sozinho, assim como eu também fiquei sempre sozinha, sofrendo em silencio por ti. Sei que ultimamente fizeste muito pelos pobres do teu pais, que criaste uma fundação, que ajudaste a construir um hospital. Sei que és boa pessoa e que a tentaçao do vil metal é demasiado grande, mas foi o suficiente para destruir duas vidas, a minha e a tua.
Eu perdoo-te Bernardo e espero que tu me perdoes ter sido tão casmurra ao ponto de nunca te ter permitido pedires desculpa olhos nos olhos. Foi aqui que vi os dois lados de mim. Que também eu poderia ter feito melhor, poderia ter sido melhor. Se tivesse perdoado na hora certa, se tivesse falado contigo e olhado nos teus olhos, teria visto o amor e quem sabe poderíamos hoje estar a envelhecer juntos e felizes…
Espero que as minhas palavras te vão encontrar de saúde, sem grande problemas com o reumático como os que eu cá tenho.
Recebe um abraço carinhoso
De alguém que nunca deixou de te amar...
Mariana”
(Texto de ficção para a Fabrica das Histórias)
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