É verdade caros leitores, não há amor como o primeiro, e a prova disso é a minha própria história de amor. Querem ouvir?
Ainda usávamos fraldas quando nos vimos pela primeira vez. Ele e a sua família tinham acabado de se mudar para a casa ao lado da nossa. Depois dos primeiros dias de timidez começamos a brincar. Ele trazia os carrinhos para o nosso jardim e eu punha as bonecas em cima dos carros. Depois inventávamos que íamos todos passear, os bonecos eram os filhos e nós, a mãe e o pai. Depois, a minha mãe fazia um bolo de laranja e leite com chocolate para o lanche e comíamos, felizes, sentados numa pequena manta debaixo do carvalho que ocupava uma grande parte do jardim. E riamos muito de tudo e de nada e éramos felizes.
Depois veio o tempo da escola e íamos os dois de mão dada até à escola. As nossas mães, atrás, conversavam e eram amigas. Deixavam-nos na escola e sentávamo-nos sempre um ao lado do outro. No recreio ele não ia jogar à bola com os amigos enquanto não tivéssemos lanchado os dois, sentados nos degraus da parte de trás da escola. Depois se algum menino ou menina se metia comigo era certo que ele me defendia, debatia-se e batia até que me tivessem pedido desculpas. Quando ele rasgava as calças na escola eu pedia à minha mãe que as cosesse para que a mãe dele não lhe ralhasse. Depois da escola saiamos a correr para a rua e brincávamos até que a noite nos obrigasse a voltar. Foi ele que me ensinou a andar de bicicleta e fui eu que o ajudei em todas as lições que ele não conseguia perceber. Partilhamos segredos, inventamos brincadeiras. Depois do jantar escapávamo-nos de casa e íamos ver as estrelas deitados no telhado, nas traseiras da casa dele. Dávamos as mãos conversávamos horas e horas a fio sobre tudo e sobre nada. E os anos passavam tranquilos e felizes.
Depois veio a adolescência e com ela alguma estranheza de sentimentos. Os abraços que tantas e tantas vezes tínhamos trocado tinham agora outro sabor. Olhávamos nos olhos um do outro e sorriamos. Depois um dia houve um beijo. E depois repetimos esse beijo. E depois dessa noite e desses beijos soubemos que seriamos um do outro para sempre.
Dissemos aos nossos pais aquilo que eles já sabiam. Dissemos que era amor o que nos unia. Era o nosso primeiro amor e tínhamos a certeza de que seria o último. Tínhamos certeza de que nada nem ninguém nos poderia separar. Fizemos planos para o casamento, imaginamos os nossos filhos a brincar ali mesmo naqueles jardins onde nós sempre brincamos. Planeamos viagens e imaginamos chegar a velhos de mãos dadas.
Depois um dia veio a faculdade e tivemos que separar os nossos caminhos pela primeira vez. Foram dias tristes os que antecederam a partida, cada um para uma cidade diferente. Depois as saudades foram demasiadas e tivemos as nossas primeiras desavenças. Depois conhecemos outras pessoas e desligamo-nos um pouco. Terminamos.
Durante alguns anos namoramos outras pessoas, fizemos outros planos. Crescemos. Parecia-me que éramos felizes. Mas não éramos. Nenhum amor era como tinha sido o nosso amor.
E tivemos a certeza absoluta disso no dia em que nos voltamos a encontrar. Cara a cara, olhos nos olhos. Foi num dia de Outono e as folhas cobriam o jardim de casa dos meus pais. Ele era agora um homem. Deixara crescer uma barba, que embora rala, lhe ficava bem. Os olhos azuis eram agora os olhos de um homem, o adolescente tinha ficado para trás no tempo. Eu própria estava diferente, mais mulher. Olhamos um para o outro longamente. Depois ele caminhou até mim em silêncio e abraçou-me carinhosamente. Foi como se o tempo não tivesse passado. Beijamo-nos e nesse beijo estava a certeza de que afinal iríamos ficar juntos. Para sempre…
Texto de ficção escrito para a fábrica das histórias por Cláudia Moreira
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. Não há amor como o primei...